Ainda tem jeito...

Edvalson Bezerra Silva (Mocoin)*

Vitorino Freire, cidade localizada na região Nordeste do Brasil, incluída no ecossistema amazônico, tem apenas 59 anos de fundação. É um retrato das pequenas cidades do estado do Maranhão e uma criança, se comparada com outras cidades do País. Sua população residente registrou um crescimento insignificante nos últimos anos: de 30.885 em 1991 para 31.658 habitantes em 2010, segundo dados do IBGE, destoando do que ocorre nas grandes cidades brasileiras. 

O censo é a fotografia de um determinado momento. Vamos analisar, juntos, outros dados para tentar entender esse fenômeno. O mesmo levantamento mostra também que mais da metade da população, 16,97 mil habitantes situa-se na faixa etária entre 10 e 29 anos. Jovens, portanto!  Outro dado, de acordo com o Censo Escolar realizado em 2009 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP), do Ministério da Educação, mostra um total de 8,34 mil matrículas no ensino fundamental e no ensino médio (7.059 e 1.288, respectivamente). Fica claro que mais da metade dos jovens está fora da escola.

Não há, também, registro de estabelecimento público ou privado de curso superior. Os cursos existentes são oferecidos por faculdades de outras cidades. Esses fatores, aliados, levam os jovens ou a família do jovem manda-lo a outra cidade para prosseguir os estudos. A falta de oportunidades de empregos ajuda a colocar grande parte da juventude naquilo que os especialistas consideram um perigo: o ócio, que os leva a atividades nada nobres como o contato com drogas e até o tráfico, que pode aparentemente gerar uma renda fácil, mas que fatalmente os conduzirá ao sistema prisional do Estado, também falido, ou até à morte por overdose.

Insegurança pública

Vitorino Freire não é mais uma criança. Mas as autoridades parecem vê-la como tal. A segurança está muito longe de chegar ao padrão de, pelo menos, próximo do desejável. O assalto recente à agência do Banco do Brasil da cidade ilustra isso. Bandidos de outros estados e alguns “laranjas” arrebanhados em cidades próximas, segundo o que foi divulgado pela imprensa até o momento, aproveitando-se da fragilidade da segurança pública, organizaram o roubo. Nas cidades grandes a possibilidade de sucesso numa ação desse tipo seria bem menor.

Um dos jornais de circulação diária do Maranhão noticiou que a justiça havia recolhido dos fóruns de cidades do interior armas, apreendidas pela polícia, que não constituíam provas de crimes em curso de julgamento. Vitorino figura na cabeça dessa estatística com a maior quantidade de armas brancas recolhidas. Se por um lado isso pode ressaltar a ação policial no desarmamento, denuncia também que há um quantitativo muito grande de jovens ociosos e armados, potenciais infratores das leis.

Trânsito caótico

Outro dado que chama a atenção no censo do IBGE é a frota de veículos da cidade: um total de 586 automóveis e caminhonetes contra 2.525 motos e motonetas. Esse número expressivo não é privilégio só de Vitorino. A “invasão” de motos acontece em todas as cidades do Brasil, pela facilidade de aquisição. Talvez em proporção menor. O preocupante nisso é o “caos” em que se transforma o trânsito da cidade, lembrando cidades de países da África, Ásia e América do Sul, mostradas pela TV. Jovens ociosos, armados e motorizados!


Não se obedecem as Leis de trânsito mais elementares, que deveriam ser respeitadas em todo o Brasil (mão e contra-mão, estacionamento, preferenciais, situação de regularidade de veículos e de condutores, dentre outras), mesmo aquelas que dizem respeito à segurança dos próprios condutores de motos como o uso de capacetes, número de passageiros por veículo, etc. A criança cresceu e ninguém quer ver!

A base histórica da cidade que começou pela saga aventureira de um
lavrador, ao escolher as terras férteis que encontrou na região para trabalhar e residir, poderia servir de inspiração para que a região viesse a se tornar um importante pólo de produção de agricultura e pecuária, adotando práticas modernas. Ao contrário, as práticas agrícolas são as mesmas que os nativos do Brasil utilizavam quando os portugueses aportaram por aqui: queima da mata nativa e plantio sobre as cinzas, que leva à deterioração do solo e à desertificação. 

Essa “enxurrada” de números desse texto não deve levar à conclusão de que todos os jovens estão na mesma situação. Valores familiares são importantes e fortes pilares presentes na formação do caráter da grande maioria dos jovens. Prova disso são os inúmeros vitorinenses que se dedicam e atuam, com destaque, nas mais diversas áreas do conhecimento, que vão da produção literária e cultural à medicina, judiciário e outras carreiras. Isso é um forte indicativo de que ainda tem jeito!

A solução passa pela ação conjunta da sociedade, autoridades, instituições públicas e privadas. A saída são ações sérias e a união de todos. Se não resolver definitivamente os problemas, certamente contribuirá para minimizar as mazelas sociais e amenizar os efeitos nocivos da omissão.

*Edvalson Bezerra Silva (Mocoin), jornalista (MTB 02998 DF), professor e escritor, natural de Vitorino Freire, MA.

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